A absurda proposta de Paulo Guedes para o Imposto de Renda das pessoas físicas: argumentos falsos e injustiça crescente

Estudo do Sindireceita revela que, em 2018, as deduções com saúde e educação reduziram a base de cálculo do imposto de renda em R$ 110 bilhões. No mesmo período, R$ 591 bilhões foram distribuídos como lucros e dividendos totalmente isentos do Imposto de Renda. Veja aqui o estudo Mais Simples Mais Justo completo.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, pretende reformar o Imposto de Renda por meio da eliminação das deduções legais de despesas com educação e saúde. Sustenta o ministro que essas deduções favorecem apenas os mais ricos. Também pretende reduzir a alíquota superior da tabela progressiva.

Como ocorrido na reforma da Previdência, argumentos falsos são apresentados pelo governo e reverberados pela imprensa. São mentiras criadas e repetidas para convencer a imensa maioria da população, constituída por pobres e remediados, a agir contra seus próprios interesses e aderir à agenda dos ricos (população com renda acima de 40 salários mínimos mensais) e super-ricos (proprietários de grandes empresas, bancos e latifúndios), parcela mínima da população, mas que tem grande representação no governo, no Parlamento e que é dona dos meios de comunicação.

A proposta de Guedes é uma verdadeira sentença de morte à classe média e é inconstitucional! O artigo 153 da Constituição Federal determina que o Imposto de Renda deve obedecer aos princípios da generalidade (alcançar todas as rendas), da universalidade (impor-se a todas as pessoas) e da progressividade (quanto maior a renda, maior a tributação).

Não se trata de uma mera recomendação, mas de um princípio tributário inafastável, uma proteção constitucional dos contribuintes contra abusos e desvios do poder estatal. As duas alterações pretendidas pelo Ministério da Economia ferem a determinação constitucional. As deduções de despesas com saúde e educação ajustam a renda do contribuinte à sua real disponibilidade. Ao afastar essas deduções, retiramos o caráter pessoal da tributação e submetemos à mesma carga tributária pessoas que têm disponibilidades distintas. Nada mais injusto!

O Brasil é um dos países mais desiguais do mundo. É o que nos mostram os grandes números do Imposto de Renda apresentados pela Receita Federal, cujos dados (base 2018) serviram para elaboração de todos os gráficos deste estudo. A maioria da população brasileira é muito pobre e não paga Imposto de Renda. Dentre os cerca de 30 milhões de brasileiros que apresentaram declaração de ajuste do Imposto de Renda em 2019, quase totalidade se encontra nas faixas de renda dos trabalhadores assalariados e pequenos empreendedores (até 40 salários mínimos).

Acima desse patamar se encontra o grupo dos ricos e super-ricos, constituído pela elite dos profissionais liberais e, sobretudo, pelos grandes proprietários. No Brasil, a renda nacional está concentrada nas mãos de uma minoria, que sobe exponencialmente a partir dos ricos e super-ricos.

Vemos que, quanto maior a renda, menor a participação dos rendimentos tributáveis sobre o total da renda e maior a participação de rendimentos isentos. Rendimentos isentos, como os lucros e dividendos distribuídos aos proprietários de empresas, não sofrem tributação do Imposto de Renda. Isso significa que o Imposto de Renda, que deveria ser progressivo, no Brasil é regressivo, pesando muito mais sobre os assalariados de classe média do que sobre os grandes proprietários, a ínfima minoria de 0,1% da população que concentra cada vez mais a riqueza nacional.

Ao contrário do que sustenta o ministro da Economia sobre as deduções favorecerem os mais ricos, vemos que as deduções com educação e saúde se concentram nas faixas de renda da classe média. Inversamente, as isenções, sobretudo de lucros e dividendos, estão concentradas nas faixas de renda dos ricos e super-ricos e representam um benefício fiscal muito maior.

As deduções, como vimos, são medidas de justiça tributária. A dedução com educação, por exemplo, foi criada como incentivo à qualificação da população. Isso é essencial para a mobilidade social e a produtividade do país. Esses benefícios, em 2018, reduziram a base de cálculo do imposto de renda em R$ 110 bilhões. No mesmo período, um valor muito maior (R$ 591 bilhões) foi distribuído como lucros e dividendos totalmente isento do imposto de renda.

A reforma do Imposto de Renda pretendida por Paulo Guedes subverte todos os princípios de uma tributação equitativa. Retira R$ 110 bilhões de renda da classe média, enquanto preserva R$ 600 bilhões do rendimento do capital de ricos e super-ricos; em boa monta, lucro excedente que não sofre tributação nem na pessoa jurídica, nem na física.

Educação e saúde são direitos universais que deveriam ser garantidos pelo Estado. Privar a classe média dessas deduções significa penalizá-la duplamente: primeiro, obrigando-a a pagar por um serviço que deveria ser ofertado pelo Estado e depois fazendo incidir Imposto de Renda sobre esta despesa. Ao retirar a capacidade da classe média de pagar por educação e saúde de melhor qualidade também se sobrecarrega os sistemas públicos de educação e saúde, que já não atendem de forma adequada à maioria da população que deles depende. Para os ricos e super-ricos, esses gastos não são significativos, mas para a classe média são uma prioridade familiar, o elemento mais relevante de sua despesa.

A concepção de Guedes para o Imposto de Renda é de uma crueldade absurda, uma sentença de morte à classe média. Se levada a cabo essa reforma, um fosso insuperável se abrirá entre os ricos e super-ricos e os 99% restantes da população. Mas talvez seja exatamente esse o plano.