Governo unifica programas sociais para evitar fraudes

Governo unifica programas sociais para evitar fraudes

Medida vai beneficiar famílias que devem receber até três vezes mais valor pode passar de R$ 100.

Para impedir fraudes e desburocratizar ao máximo o atendimento dos programas sociais, o governo federal decidiu unificar as ações de transferência de renda: Bolsa-Escola, Bolsa-Alimentação, Vale-Gás e o Cartão-Alimentação do Programa Fome Zero - viga-mestra para a unificação dos programas sociais. Também serão incluídos no cadastro único todas as ações de transferência de renda espalhadas pelos Estados e municípios, o que ainda servirá para amenizar desavenças entre os governadores e prefeitos.
Mas a principal vantagem será sentida no bolso de quem está inscrito nos programas. A previsão do governo é que, com a unificação, o valor do benefício seja triplicado. Inicialmente as famílias inscritas no cadastro único deverão receber entre R$ 50 e R$ 95. Hoje, o valor médio dos pagamentos dos programas sociais da União é de R$ 24 mensais. De imediato, a previsão é beneficiar 1,2 milhão de famílias. Até dezembro, 3,6 milhões de famílias deverão estar incluídas no Cadastro Único.
Para isso, segundo a assessora especial da Presidência Ana Fonseca, designada para comandar o processo, o governo  iniciou um cruzamento entre o cadastro nacional dos programas federais já existentes e os cadastros realizados pelos governos estaduais. “O cruzamento dos cadastros é para evitar situações como uma família recebendo do Bolsa-Escola R$ 15 por filho e uma outra família, na mesma situação de pobreza e sua vizinha, recebendo R$ 60 de um programa estadual. É por isso que temos que acabar com a superposição dos programas, porque tendo um cadastro comum e recursos comuns poderemos ampliar a cobertura do programa e também os recursos”, diz.
Pelo menos governos de 12 estados que têm programas próprios manifestaram interesse em participar do esforço da unificação através de duas modalidades. Com recursos financeiros e por intermédio de ações complementares, como treinamento de pessoal e programas de isenção de taxas de energia e água, por exemplo, para famílias de baixa renda. Com o programa Renda-Cidadã, o governador Marconi Perillo (PSDB-GO) paga R$ 60 a cada família. Com a unificação, Perillo espera elevar o valor para R$ 120. Será exigida contrapartida das famílias como manter os filhos na escola. Os adultos analfabetos terão que estudar. As gestantes deverão apresentar exames periódicos e o cartão de vacinas das crianças terá que estar em dia. Por enquanto os beneficiados poderão usar os cartões que já possuem para receberem o benefício. Só depois de dezembro que passará a valer o novo cartão do Bolsa Família.

Mudança vai elevar gasto na área social

Com a unificação dos programas sociais, se especulava nos bastidores em Brasília, que cada família poderia receber até R$ 150. Mas esses cálculos tiveram que ser refeitos. A previsão inicial era destinar R$ 8 bilhões, mas por causa de cortes no Orçamento, o número caiu para R$ 5,3 bilhões. Para fechar as contas, o governo tenta obter financiamento internacional para engordar a verba em R$ 7 bilhões e cumprir a promessa de beneficiar 12 milhões de famílias o mais rápido possível. Mesmo diante da penúria financeira, o Presidente não se abalou. Disse aos governadores, que a unificação dos programas sociais vai propiciar uma economia de R$ 450 milhões por ano, dinheiro que o governo federal gasta só nas diferentes operações de pagamento feitas pela Caixa Econômica Federal.
A unificação dos programas sociais começou a ser articulada no fim do ano passado, mesmo antes do presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, tomar posse. A idéia começou a ser discutida com os governadores eleitos pelo Partido dos Trabalhadores (PT) e da oposição. O governador de Goiás Marconi Perillo (PSDB-GO) sugeriu a proposta ao presidente Lula em dezembro do ano passado: “O governo federal tomou a decisão de unificar os programas federais e buscar estados e municípios para que possa fazer um único programa de transferência de renda. Eu propus inclusive que seja de complementação de renda. No caso de Goiás, temos hoje 200 mil famílias beneficiadas, e pretendemos estender a mais 100 mil famílias. Nossa intenção é ter 300 mil famílias em Goiás, e dispomos a colaborar com 50 % dos recursos.” disse.
A opção pelo cadastro único começou a ser debatida depois que foram divulgadas informações de que famílias nas mesmas condições de pobreza estavam sendo discriminadas pela falta de documentos básicos, como a certidão de nascimento, ou haviam sido excluídas de programas em decorrências de má-fé de prefeitos, que tentaram incluir familiares e pessoas que não necessitam de receber recursos dos programas.
As falhas foram levantadas pelo ministério Extraordinário da Segurança Alimentar e Combate à Fome. “No cadastro do Fome Zero, vamos de domicílio em domicílio, e temos encontrado um percentual de 30% de erro. Praticamente um em cada três beneficiários está indevidamente colocado, ou recebe de outro programa, ou a renda declarada está desatualizada, ou o endereço mudou, um conjunto de erros acumulados”, disse o titular da pasta ministro José Graziano.
Para evitar problemas que afetassem a credibilidade do programa Fome Zero, o presidente Lula, que por duas vezes chegou a antecipar a unificação do cadastro, resolveu prorrogar o anúncio até que todas as falhas no cadastro fossem eliminadas.
Lula viajou para os Estados Unidos, México e Cuba e na volta reuniu novamente os governadores na Granja do Torto, quando conseguiu apoio ao projeto. O governador de Minas Gerais Aécio Neves, disse por exemplo, que nenhum governador iria se recusar a abrir as informações dos cadastros estaduais em benefício do cadastro único. “O presidente e governadores fizeram questão de ressaltar que não há preocupação com a marca do programa. O programa é de todos e para todos e deve obviamente respeitar as peculiaridades de cada Estado”, disse Aécio.
Para eliminar desavenças e conter as crises de vaidade ficou decidido que o novo cartão, que dará acesso aos programas de distribuição de renda, terá as cores verde e amarelo e trará as logomarcas da União, Estados e Municípios.

  Perfil da Coordenadora 

Ana Fonseca tem 51 anos, é cearense de Fortaleza. É graduada em Ciências Políticas pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), onde também fez mestrado em  História Social do Trabalho. O doutorado concluiu na Universidade de São Paulo (USP), com o tema “Família e Políticas de Renda Mínima”, que mais tarde se transformou em livro. Trabalhando desde 1986 como pesquisadora na área de Políticas Públicas, mais especificamente com programas de Transferência de Benefícios Monetários, Ana foi chamada em 2000, pela então candidata à Prefeitura de São Paulo, Marta Suplicy, para ajudar a elaborar o Projeto Renda Mínima, juntamente com o secretário municipal do Trabalho, o economista Marcio Pochmann, também da Unicamp. Os resultados chamaram a atenção do presidente Lula. O anúncio oficial ocorreu no dia 05 de novembro de 2.002. Ana Fonseca foi anunciada pelo então coordenador-geral do governo de transição Antônio Palocci, para integrar a equipe. O trabalho foi bem avaliado e Ana Fonseca ganhou o posto de titular no governo Lula como assessora especial da presidência para comandar a unificação dos programas sociais..

Integra do documento assinado pelos governadores e prefeitos:

“Considerando que o principal desafio que se apresenta para a sociedade, para o governo federal e os Estados, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e os 27 governadores firmaram um compromisso que detalhado em nota oficial com os seguintes pontos:

1. O governo federal e os governos estaduais atuarão articuladamente no levantamento e utilização de informações cadastrais, na manutenção das bases de dados e no esforço de participação, controle social, transparência e troca de informações.

2. O governo federal e os governadores promoverão a alocação de recursos próprios e o incremento na implementação de programas complementares destinados aos grupos familiares atendidos pelo Programa de Transferência de Renda com Condicionalidade (PTRC), potencializando assim, nas condições de emancipação.

3. Os governos estaduais e o federal definirão sua possibilidade de participação complementar e/ou financeira no programa de transferência de renda com condicionalidade (PTRC) de forma a ampliar a cobertura no seu respectivo estado e ou elevar o valor do benefício por família.

4.O governo federal adotará as providências necessárias para que o PTRC seja iniciado em outubro de 2003. A pactuação com vistas ao cumprimento do presente compromisso deverá ser implementada até dezembro de 2003".