Operação Cataratas

Operação Cataratas

Prefeito teme caos social em Foz do Iguaçu
O prefeito de Foz do Iguaçu, Paulo Mac Donald Ghisi, tem cumprido uma agenda apertada desde que assumiu o mandato em 1º de janeiro desse ano. Além dos problemas normais que a maioria dos prefeitos do País enfrentam, ele tem pela frente um enorme desafio: o de conciliar o crescimento da região com as conseqüências do aumento da fiscalização na fronteira do Brasil com o Paraguai, desde o início da Operação Cataratas, no começo do ano passado.
Se, para o governo federal a Operação Cataratas só tem trazido orgulho e alegria, para o o prefeito eleito só tem aumentado suas preocupações. Especialmente agora com a ampliação da fiscalização e após o início de uma outra operação na região, chamada de "Tolerância Zero", que além da Receita Federal recebeu o reforço das Polícias Militar, Civil e Federal. A operação "Tolerância Zero" começou em fevereiro, em 23 municípios da região maringaense e vai até o final de maio com operações diárias. O foco principal dessa nova ação são os ônibus de turismo e sacoleiros. A intenção é evitar que o crime faça escala em Maringá. Em dez dias de operação, foram apreendidos seis ônibus de sacoleiros e vistoriados dois ônibus de linha que saíram da região Oeste com destino a Londrina.
O prefeito de Foz esteve em Brasília na primeira semana de março para se reunir com parlamentares paranaenses e com representantes do governo federal. Defensor da ampliação da cota de compra para US$ 300 o prefeito critica o endurecimento da fiscalização e a falta de preocupação com as repercussões sociais. Além da ampliação da cota, ele também encaminhou ao governo solicitações para o desenvolvimento do turismo rodoviário, a reestruturação da Ponte da Amizade, maior segurança no transporte e revitalização da cidade.
Em entrevista à equipe da Revista Tributus, ele fala sobre as dificuldades causadas no município pela ação da Receita Federal e aponta alternativas para melhorar o atendimento aos consumidores que vão ao Paraguai.

TRIBUTU$ - Foz do Iguaçu virou o centro das atenções no País, quando o assunto é contrabando e pirataria, especialmente após o início da Operação Cataratas. O que mudou na cidade desde o começo da ação?
Paulo Mac Donald Ghisi - Eu fui ver miséria e favela pela primeira vez na minha vida na década de 60. Foi numa época em que foi feita uma grande erradicação de café, porque os preços não compensavam. Foi determinada a erradicação dos cafezais e não se pensou nas pessoas que trabalhavam nas lavouras. Foi quando surgiram as grandes favelas no Paraná.
Hoje, Foz do Iguaçu vive um processo semelhante. Está se pensando em acabar com o contrabando e o descaminho, que foi consentido durante todos esses anos pela Receita e pelo governo federal, mas, outra vez, se esquecem das milhares de pessoas que vivem dessa atividade. Foz do Iguaçu tem que ter uma alternativa de emprego e sobrevivência para essa população. Precisamos de geração de emprego, senão o que veremos lá é uma convulsão social.
Uma tragédia ainda pior pode acontecer no Paraguai, porque eles dependem muito mais desse comércio. Pode haver todos os motivos, justos inclusive, para por fim a essa situação, mas isso se consolidou ao longo do tempo e as pessoas se acostumaram a viver disso. Foi gerada uma economia e o corte dessa rede vai deixar milhares de pessoas na miséria.

TRIBUTU$ - A prefeitura tem informações sobre o número de pessoas envolvidas com o comércio de produtos no Paraguai e que vivem na região?
Paulo Mac Donald Ghisi - Na parte do Brasil são entre 10 a 15 mil pessoas, mas no Paraguai são pelo menos 30 mil. Esses números apenas em Ciudade del Leste e Foz do Iguaçu. Nós temos que encontrar uma alternativa. Eu não gostaria de ver o que está se prenunciando acontecer na região.
E dizer que a culpa das mazelas brasileiras é aquela região, não é verdade. O contrabando que entra no Brasil passa por todas as fronteiras. Também não é só lá que passa a droga, isso acontece em todo o País. Nem mesmo os Estados Unidos conseguem evitar a entrada de drogas.

TRIBUTU$ - Então, por que na opinião do senhor Foz do Iguaçu está recebendo todo o destaque na mídia nacional e mostrada como o "portão de entrada" do contrabando no País? O que há por traz de toda essa exposição?
Paulo Mac Donald Ghisi - Porque Foz se tornou um local de grande movimento. No início, as famílias vinham para a região ver as obras da hidrelétrica de Itaipu, ver as cataratas. Esses turistas ficavam nos hotéis e faziam suas compras nas lojas no Paraguai. Com o tempo, formou-se uma classe de sacoleiros, que passou a fazer compras e vender em feiras nas grandes cidades.
Ninguém pode ignorar que tem uma Feira do Paraguai em Brasília, como também há em São Paulo, Florianópolis e Belo Horizonte. Em todas as cidades há uma feira com produtos vindos do Paraguai. E porque a Polícia não reprime as feiras? Porque a culpa é de Foz do Iguaçu? É uma situação que nos faz pensar muito.
Por fim, chegamos a situação atual com a absoluta leniência e consentimento da Receita Federal, que não fiscalizava. Porque dizer que há fiscalização quando sai um comboio de 500 ônibus carregados de mercadoria e ninguém faz nada. Quantas e quantas vezes isso aconteceu? A lei tem de ser cumprida, mas é preciso dar alternativa de vida para essa população.

TRIBUTU$ - Na avaliação do senhor é possível inverter a situação atual e promover uma migração das pessoas que atuam como sacoleiros para empregos em outros setores da economia, como por exemplo o turismo, que é uma das principais vocações da região?
Paulo Mac Donald Ghisi - Temos potencial em turismo e indústria. Mas precisamos ampliar a cota para US$ 300. Queremos que haja fiscalização, mas que seja inteligente e racional. O que vemos é uma fiscalização deficiente. Muitas vezes tem um servidor da Receita, as vezes sozinho, e atrás dele uma fila de quatro, cinco mil carros. Para fiscalizar um veículo é preciso parar a fila inteira.
Existem maneiras de se fazer uma fiscalização extremamente rigorosa sem filas na ponte. Essa fila tira emprego formal no Brasil. O paraguaio que vinha para o País para consultas médicas, cinema, restaurantes, bancos e escolas não vem mais. Essa pessoa não vai se sujeitar a ficar por horas na fila. Se sujeita a essa situação aqueles que estão no comércio ilegal porque vivem disso. Por isso a fiscalização tem que ser rápida e não pode vitimar a fronteira.
Não podemos esquecer que no Paraguai existem cerca de 400 mil brasileiros que trabalham na agricultura. Essa gente vinha para Foz e usava a cidade e o comércio local como base para suas compras e negócios. Essa situação ninguém mais passa. Estão nos tirando empregos formais, por causa desse sistema. Queremos uma fiscalização rigorosa, mas ágil, sem as filas.

TRIBUTU$ - O rigor da Operação Cataratas além de impedir o contrabando também serviu para ampliar as apreensões de drogas. Foi possível perceber redução dos índices de criminalidade na região?
Paulo Mac Donald Ghisi - Pelo contrário, temos na região um dos piores índices de homicídios do mundo. Esse ano, nos 65 primeiros dias, tivemos 67 homicídios. É quase uma guerra civil. Aumentou muito, e quanto mais operação maior a crise econômica.

TRIBUTU$ - O que a prefeitura pode fazer e tem feito para amenizar essa situação?
Paulo Mac Donald Ghisi - Estamos tentando levar para a cidade um frigorífico que vai gerar 1,4 mil empregos. Quando estiver em operação, poderá chegar a 3 mil empregos, além dos produtores que vão fornecer suíno. São cerca de 400, com possibilidade de termos 150 deles no Paraguai. Para isso, temos que vencer a concorrência entre as cidades. Temos uma cidade que ofereceu a construção, o terreno e 20 anos de isenção fiscal. Se eu tivesse condição de oferecer, faria imediatamente.
Além disso, são muitas as alternativas de empregar a mão-de-obra despreparada, acostumada a passar a mercadoria pela ponte. Temos aqui muita mão-de-obra que poderia ser utilizada na indústria de confecções. Mas precisamos que o governo federal não nos mande somente a Receita, mas também os Ministérios da Indústria e Comércio, Turismo e Segurança para que possamos modificar a região.

TRIBUTU$ - A Operação Cataratas que começou como temporária se estendeu e não tem data definida para terminar e a pressão sobre contrabandistas, inclusive deve aumentar. Como o senhor avalia toda essa situação?
Paulo Mac Donald Ghisi - Em Brasília estamos atuando para agilizar a fiscalização na ponte e pela implementação efetiva da cota de US$ 300. Criamos um grande programa de divulgação da cidade e do turismo, melhorando pontos de atração para segurar o turista em Foz.. Estamos dobrando vagas nas creches. Começamos um grande programa de reformulação da saúde, temos 21 equipes do programa de saúde da família e vamos chegar a 32. Iniciamos um programa de construção, dotando as escolas com centros de convivência escola/bairro, com quadras poliesportivas, porque o esporte é uma forma de tirar os adolescentes das ruas e das drogas.

TRIBUTU$ - Durante a operação houve queda da arrecadação?
Paulo Mac Donald Ghisi - Houve perda, mas não significativa.

TRIBUTU$ - A imprensa nacional voltou a noticiar que o governo dos Estados Unidos continua preocupado com a questão da segurança na tríplice fronteira, em especial com Foz do Iguaçu. O senhor acredita que possa haver um agravamento dessa situação nos próximos anos?
Paulo Mac Donald Ghisi - Não acredito nisso. Recentemente o embaixador norte-americano, John Danilovich, esteve em Foz do Iguaçu por cinco dias. Conversei com ele por horas, visitamos juntos Ciudade del Leste e ele nos disse que o problema na região era desenvolvimento econômico.
A secretária de Estado Americano, Condoleezza Rice, quando foi defender sua propositura do cargo, foi questionada pelo senador Cristofer Doth sobre o problema do terrorismo na tríplice fronteira. Ela também disse que a questão ali era um problema de desenvolvimento econômico e que os norte-americanos seriam parceiros. Então não acredito nessa conversa, que não passa de uma notícia fora de época.

TRIBUTU$ - Toda pressão imposta está relacionada diretamente à defesa da propriedade intelectual?
Paulo Mac Donald Ghisi - A propriedade intelectual é um problema do mundo interior. Aliás a grande diferença dos países desenvolvidos foi a invenção e que faz o cidadão pesquisar e passar anos nas universidade é o fato de ser proprietário da sua invenção. Sem a patente e a propriedade intelectual, qual incentivo terá o inventor. Sem esse incentivo o Bill Gates teria passado dias pesquisando para criar seus programas de computador.
A propriedade intelectual é necessária e deve ser regulamentada para que aqueles que detenham conhecimento não sejam senhores absolutos. Mas, ao invés de ficarmos reclamando, deveríamos investir mais em nossas universidades e nas nossas cabeças, porque temos gênios por todo o País sem oportunidade de crescer e realizar seus trabalhos.