Avanços e retrocessos do combate à corrupção no Brasil

Avanços e retrocessos do combate à corrupção no Brasil

"Mensalão": uma recompensa mensal de R$ 30 mil para parlamentares de partidos da base aliada permanecerem fiéis às posições do Executivo nas votações de seu interesse. Quanto realmente estamos pagando por isso?

Rifar o Estado brasileiro em nome da governabilidade é uma prática que evidencia as fraquezas do nosso sistema de representação. A baixa representatividade dos partidos, sua conexão aos financiadores das campanhas, a frágil fidelidade partidária: tudo isso leva o Executivo brasileiro a lançar mão de suas prerrogativas orçamentárias e oferta de cargos públicos na tentativa de coordenar as forças políticas para governar o país.

Os partidos com representação no Legislativo, por sua vez, não se negam a aceitar a participação no acordo tácito, ou mesmo a impulsioná-la, concluindo dessa maneira a lógica do ciclo eleitoral: beneficiando-se financeiramente de suas posições estratégicas em cargos de confiança e usufruindo da liberação de recursos orçamentários pelo Executivo para seus redutos eleitorais.

A lição das recentes denúncias de corrupção é a necessidade de se criar mecanismos para impedir o uso da máquina pública em favor de interesses partidários. Isso significa avançar, ainda mais, o fortalecimento das instituições políticas brasileiras, iniciado quando estas se tornaram democráticas.

Casos como Waldomiro Diniz, governo de Rondônia, Instituto de Resseguros, Correios, bem como tantos outros deflagrados em nossa história recente, acabam tendo um tratamento de exploração excessiva e isolada. Não raro, prevalece a fixação pela denúncia, pela caça a culpados e pela utilização das suspeitas levantadas como armas políticas. Entretanto, uma política de combate à corrupção bem sucedida caracteriza-se por medidas preventivas permanentes que reduzam as oportunidades para que casos como esses aconteçam.

A lamentável notícia acerca da suposta mesada parlamentar não poderia ter maior visibilidade: além de configurar uma possível tragédia política interna por si só, ela foi divulgada na véspera da quarta edição do Fórum Global contra a Corrupção, para o qual já se encontrava em Brasília a maioria das delegações dos mais de cem países participantes do evento, garantindo assim a disseminação do escândalo também internacionalmente.

O episódio representa um preocupante abalo no governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Explicar ou corrigir eventuais falhas não será nada fácil. A falta de habilidade neste momento pode exigir a canalização de todas as forças para a mera sobrevivência política do governo. Este seria o primeiro valor que pagaríamos em função dos acontecimentos: a falta de prioridade na agenda política para as questões de interesse dos cidadãos.

De valor mais elevado, talvez, seja o que muitos brasileiros já começaram a pagar: a descrença nas instituições que nos governam. Essa é possivelmente a pior conseqüência que casos como esse podem deixar.

A grande visibilidade exigirá ações contundentes. O fortalecimento institucional e a melhoria dos mecanismos de controle serão medidas necessárias para reverter a equivocada desilusão que se instala com as instituições democráticas. Casos de corrupção deflagrados podem não significar retrocessos, mas sim, oportunidades para mudanças institucionais que garantam avanços duradouros.

  • Letícia Miranda Teixeira é mestre em Ciência Política pela UnB (Universidade de Brasília), com a dissertação "A política contra lavagem de dinheiro no Brasil: o processo de absorção de um regime internacional". Pesquisa os temas corrupção e lavagem de dinheiro desde 1999 em parceria com a ONG Transparência, Consciência e Cidadania - Brasil.
  • Artigo publicado na Agência UnB.

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