Boletim Especial nº 008 : A malha como paradigma da necessidade de uma nova administração tributária

Os Técnicos da Receita Federal sempre trabalharam com a Malha Fiscal, analisando declarações, providenciando a intimação eletrônica, analisando documentação recebida dos contribuintes, encaminhando os documentos apresentados para a fiscalização verificar a idoneidade deles, fazendo a liberação ou efetuando os devidos acertos através do FAR e FAR-S, sendo que este último, resultava em auto de infração emitido/devolvido via SERPRO para posterior anuência de Auditor Fiscal responsável.

E isso muito antes da edição do Decreto 3611/2000, que em seu art. 2º, prevê, verbis:

?Art. 2o Incumbe ao ocupante do cargo efetivo de Técnico da Receita Federal auxiliar o Auditor-Fiscal da Receita Federal, no desempenho das atribuições privativas desse cargo e sob a supervisão do Auditor-Fiscal da Receita Federal, especialmente:

I - em relação ao disposto no inciso II do artigo anterior, analisar e instruir processos, ressalvada a atribuição privativa do Auditor-Fiscal da Receita Federal para proferir decisões, intimar sujeito passivo e requerer diligências, em processos submetidos a julgamento em instância administrativa

II - em relação ao disposto no inciso III do artigo anterior:

a) proceder à conferência de livros, documentos e mercadorias do sujeito passivo, inclusive mediante elaboração de relatório, relativamente aos procedimentos fiscais de:

1. fiscalização, diligência e revisão de declarações ?

Porém, em virtude da implementação do novo sistema Sief, a Portaria conjunta da Cotec/Cofis acabou restringindo a atuação dos Técnicos da Receita Federal no trabalho da malha fiscal. Isto porque ela criou três perfis de acesso ao Sistema Malha Fiscal IRPF ? Sief, devendo o usuário ser cadastrado de acordo com a Portaria de habilitação, nas seguintes opções: a) SUPERVISOR b) AFRF e c) OUTROS.

Assim, os Técnicos devem ser obrigatoriamente cadastrados na opção ?OUTROS?, perfil muito restrito, pelo qual não mais poderá acessar o Sistema Malha com a amplitude desejável, para efetuar o acerto de Declarações ou sua Liberação, uma vez que somente poderá ?analisar? a declaração, sem possibilidade de nenhuma providência prática.

Logo após a ?análise? das declarações, os Técnicos devem encaminhar a declaração para o AFRF cadastrado na opção AFRF ou na opção SUPERVISOR, o qual deverá novamente ?analisar? a declaração para realizar os devidos acertos ou, quando for o caso, a liberação.

Nem se consegue imaginar como se daria tal procedimento, pela impossibilidade prática de assim operar-se a malha Fiscal. Por acaso ocorreria o ?empréstimo? de senhas?

Parece que a norma não obedeceu à prática nem a histórica participação dos Técnicos nesse trabalho, uma vez que além de não criar um perfil específico que espelhe a realidade dos atos praticados por eles, acabou vedando que eles possam continuar a desenvolver normalmente suas atividades nessa área.

E as conseqüências funcionais foram duas: Em determinadas unidades, os TRF foram retirados dessa atividade, sendo deslocados para outros setores, e, em outras, acabaram por trabalhar como se AFRF fossem, sem, no entanto, assumir a autoria dos serviços prestados.

Para a instituição, restringindo-se o aproveitamento de mão de obra altamente qualificada, em órgão carente de pessoal, o resultado é desastroso: o alto índice de declarações que caíram na malha do Imposto de Renda ou nela permanecem, obrigaram reiteradas vezes o procedimento de ?corte de malha?, onde milhares de declarações foram liberadas sem qualquer verificação. Fica claro que a diminuição da capacidade operacional de qualquer setor traz enormes prejuízos para a Receita Federal.

O pior é que administradores da Receita Federal chegam a cogitar a alteração dos parâmetros de malha, de forma a somente serem objeto de retenção um pequeno número de declarações, ?apenas o número que os AFRF podem trabalhar?. Um verdadeiro absurdo. Mas o pior foi a reação de um grande número de Delegados da Receita Federal que ao serem consultados pela Cofis, sobre as possibilidades da alocação dos Técnicos na malha reagiram com e-mails agressivos, com alto teor corporativista, uma verdadeira vergonha.

A cada dia que passa a imagem da Receita Federal é deteriorada, tanto pelo atraso no trabalho de malha, quanto pela descoberta de inúmeras fraudes, muitas de simples detecção, que não foram objeto de qualquer providência anterior. Ressalte-se que a restrição dos Técnicos da Receita Federal à análise e liberação de declarações em malhas, por atos internos da Receita Federal, notadamente a partir da IN 96/2000, está em desacordo com a lei 10.593/2002 e o Decreto Federal 3.611/2000, que habilitaram os Técnicos expressamente na revisão de declarações.

Para comprovar que os Técnicos da Receita Federal trabalhavam na malha efetuando todos os procedimentos, sempre sob supervisão do Chefe, a liberação de declarações no sistema IBM vinculava o CPF do servidor atuante, podendo ser verificado que milhares de liberações e cancelamentos foram efetuadas por Técnicos da Receita Federal. Se por ventura for efetuada uma apuração especial no sistema IBM, comprovar-se-á que o número de declarações já liberadas por Técnicos é muito expressivo.

Repise-se que, na sistemática atual, grande parte das declarações que estavam em malha foram liberadas sem nenhuma intervenção da fiscalização, mediante intervenções especiais de âmbito nacional, no procedimento conhecido como ?corte de malha?. Para o bom contribuinte foi um alívio, mas para aquele que declarou com irregularidades, é um verdadeiro atestado de incompetência para a Receita Federal.

Mesmo que as dificuldades operacionais iniciais relativas ao novo sistema Sief também tenham sido responsáveis pela lentidão dos trabalhos em malha, claro está que a redução da mão de obra disponível foi o verdadeiro causador da quebra da eficácia da fiscalização.

Apesar das limitações tecnológicas, a intervenção pelo sistema IBM era facílima. Em 4 ou 5 minutos liberávamos aproximadamente 40 declarações. No novo Sief uma única liberação podia demorar até 55 minutos. Porém, se o perfil de usuário não fosse restritivo ao profissional Técnico da Receita Federal, essa questão tecnológica não teria, por si só, causado tal transtorno. Isso porque qualquer administrador local tem conhecimento de que a presença dos Técnicos da Receita Federal nessas atividades sempre tendeu a zerar a malha, como em vários exercícios anteriores, transmitindo à sociedade uma imagem de competência, agilidade e respeito aos cidadãos por parte da instituição.

Se a Receita Federal pretende efetivar um trabalho de malha fiscal com qualidade, a perspectiva é que o número de declarações em malha tenderá a crescer, agravando a situação. O cidadão-contribuinte sofrerá com a falta de respeito da administração tributária, isto é, a imagem de órgão eficiente, construído a duras penas, por décadas de esforço dos servidores, poderá ser pulverizada. Temos conhecimento de contribuintes que aguardam sua liberação desde 1999, ano em que ainda se registra 16.561 declarações em malha, e que desconhecem qualquer providência para liberar suas declarações.

Cabe ressaltar as manifestações de Auditores-Fiscais, lotados em diversas Delegacias da Receita Federal, de todo o país, reclamando do parâmetro utilizado para o acesso ao Sief e o afastamento dos Técnicos de suas atividades normais, o que acarretaria uma redução de quase 80% dos trabalhos da malha nessas unidades. Veja-se argumentos destacados de correspondência eletrônica encaminhada por AFRF da DRF/Araçatuba:

Mesmo alertada sobre a situação, nada foi feito para restabelecer a capacidade operacional da instituição no trabalho de malha, corrigindo os critérios adotados, violadores não só da realidade da Receita Federal, mas também do Decreto Federal 3.611/2000, que expressamente prevê a participação dos Técnicos nesse trabalho, uma vez que ignoram por completo nossa atuação nessa atividade, através dos anos e até mesmo na atualidade.

O primeiro pedido foi reiterado por diversos outros, desta vez devidamente protocolados, os quais continuaram sendo solenemente ignorados, uma vez que não obtivemos, até o momento, qualquer resposta.

Mas isso não significa que a administração não tenha tomado conhecimento ou uma decisão sobre a questão. Vejamos a manifestação do Sr. Luciano Valença (Cofis/Disaf ? lvalençEste endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.) em e-mail datado de fev/2002, nos seguintes termos:

Em resposta aos questionamento levantados pelas regiões quanto às funcionalidades disponíveis para os usuários enquadrados como outros no sistema malha IRPF 2001, corroborados por esta divisão junto ao Coordenador-Geral da Cofis, este posicionou-se (sendo, portanto, de agora em diante posição da Cofis/Disaf por questões de hierarquia), pela não alteração da sistemática atual.

Luciano Valença

Cofis/Disaf?

Uma decisão que não poderia ser corroborada pelo Secretário da Receita Federal, na medida em que, como já se disse, viola as disposições legais e regulamentares, em prejuízo da administração tributária. Os Técnicos têm capacidade para conviver com sistemas lentos, com falhas operacionais constantes, cujos acertos dependem de investimentos, mas serem alijados dos trabalhos de malha, mediante simples alteração de perfil de acesso do novo sistema, é algo inaceitável. O desperdício desses servidores, na medida que serão aproveitados muito abaixo de suas qualificações e experiências, agrava o problema e certamente colabora para a destruição da imagem da Receita Federal, de órgão de referência no serviço público.

Cabe lembrar que a proposta apresentada foi alterar os atos normativos, inferiores ao disposto no Decreto Federal 3.611/2000, em especial os perfis de acesso ao sistema Sief, resgatando a atividade dos Técnicos no trabalho de malha. Os Técnicos têm competência legal e capacidade técnica comprovada por anos de dedicação nesse serviço, sendo inadmissível o afastamento via restrição de acesso.

Veja-se em anexo, a sugestão apresentada que mantinha o perfil que já era utilizado pelos Técnicos, lembrando que a proposta mantém uma das características do modelo adotado, na medida em que todos os servidores que trabalham em malha, Auditores-Fiscais e Técnicos, estarão atuando sob supervisão. A opção "OUTROS" até poderia ser mantida, caso a Administração decida permitir que outros servidores, não pertencentes à Carreira ARF, atuem no sistema malha fiscal.

Veja o requerimento COTEC

A Receita Federal e a sociedade brasileira precisam que os Técnicos atuem amplamente nas atribuições reservadas à instituição, até o limite de suas atribuições legais e regulamentares.

As reiteradas decisões de restringir a atuação do profissional Técnico em diversas atividades, mediante a edição de portarias e instruções normativas, desrespeitam a Lei 10.593/2002 e o Decreto Federal 3.611/2000, sendo inaceitáveis não só do ponto de vista legal, mas também inconstitucional, por violar o princípio da eficiência da administração federal.

Para encerrar, em 2004 os Técnicos realizaram uma greve com o objetivo de ver implementada uma nova administração tributária, com novos procedimentos e métodos de trabalho (um eufemismo para o fim do corporativismo dos AFRF), bem como a criação de uma divisão especializada na repressão ao contrabando, pirataria, tráfico de drogas, armas e munições e elisão fiscal, com equipes nacionais devidamente equipadas e treinadas, investimentos adicionais em tecnologia da informação, recomposição do quadro de pessoal, com política agressiva de recursos humanos, para seleção, por concurso público, de mais 7.000 Técnicos entre outros pontos.

Alguns itens da pauta foram implementados, mas o corporativismo, ainda mais exacerbado, está vivo e atuante. Esse quadro, se não for alterado, obrigará a categoria a uma ampla mobilização, a fim de que possam atuar em toda a plenitude das competências outorgadas em Lei, sendo o eixo principal da luta o lema: ?EU QUERO É TRABALHAR?.

Como exemplo desse corporativismo exacerbado, há notícia de que uma simples expressão utilizada na "assinatura" de um Técnico em mensagem "Notes", dirigida a um administrador AFRF, causou inusitada reação contrária, por parte deste. A expressão utilizada: "Técnico da Carreira de Auditoria da Receita Federal" nada mais continha senão a verdade: que prestou concurso público para a Carreira de Auditoria da Receita Federal, e tem orgulho de integrar essa Carreira, como Técnico.

Uma ?nova administração tributária? é possível. Chega de implementar a solução fácil do aumento das alíquotas ou a criação de novos tributos. Os Técnicos querem aumentar a eficiência da Receita Federal com novos procedimentos e métodos de trabalho! O Brasil precisa, a sociedade agradece!

"Técnicos da Carreira Auditoria da Receita Federal, com muito orgulho, a serviço do Brasil, da sociedade brasileira e da instituição Receita Federal."