Crise internacional: o pretexto que faltava para o arrocho salarial dos servidores
Por Antônio Augusto de Queiroz (*)
O governo federal, que emitia sinais dúbios sobre o reajuste para os servidores públicos para 2012, vai utilizar a crise internacional, que é real, como pretexto para não reajustar os salários do funcionalismo da União pelo segundo ano consecutivo.
Embora o artigo 80 da Lei de Diretrizes Orçamentária para 2012 autorize revisão geral de remuneração, a tendência é que não haja reajuste em 2012, salvo para as carreiras que já tenham projeto em tramitação prevendo reestruturação remuneratória ou reajuste e sejam alocados recursos no orçamento do próximo ano para tanto, casos dos servidores do Poder Judiciário e do Ministério Público.
A equipe econômica, segundo palavras do ministro da Fazenda, Guido Mantega, recomendou ao Poder Executivo e fez apelo aos demais poderes e órgãos para que evitem aumento de despesa de caráter permanente, especialmente as de pessoal. Como tanto o Orçamento para 2012 quanto os projetos que prevejam reajuste devem ser encaminhados ao Congresso até 31 de agosto para que vigorem no próximo ano, muito provavelmente a equipe econômica, que é quem consolida o orçamento, impedirá a alocação de recursos para reajuste, além de bloquear os projetos que prevejam aumento de despesa com pessoal, já que esses projetos, no âmbito do Poder Executivo, também precisam contar com seu aval.
Assim, pelo menos em relação ao Poder Executivo, a tendência é que a equipe econômica impeça a inclusão de recursos no orçamento e também o envio de projetos com aumento de despesa. Já em relação aos demais poderes (Judiciário e Legislativo) e órgãos (Ministério Público e Tribunal de Contas da União), caso resolvam exercer sua autonomia administrativa e financeira, a equipe econômica pouco poderá fazer, exceto negociar os valores que forem destinados a pessoal no momento da consolidação orçamentária.
Com isto, a relação do Governo com os servidores do Poder Executivo, caso se confirme a decisão da equipe econômica de não dar reajuste em 2012, vai azedar, especialmente se, como tudo indica, o projeto de previdência complementar, que cria despesa para a União, for mesmo votado no Congresso. E consta que já teria havido acordo entre o Governo e o relator na Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público da Câmara, deputado Sílvio Costa (PTB-PE).
O governo, se confirmada a vontade da equipe econômica, terá um segundo semestre bastante tumultuado, com greves em vários setores do serviço público, especialmente em áreas estratégicas, como Polícia Federal e Receita Federal, entre outras. Isto sem contar os reflexos da crise internacional na economia e as pendências no Congresso. É torcer para que a economia não entre em recessão, hipótese em que o governo ficaria muito vulnerável em termos de apoio popular. O desafio é grande.
(*) Jornalista, analista político, diretor de documentação do Diap, colunista do portal Congresso em Foco, autor dos livros "Por dentro do processo decisório - como se fazem as leis", "Por dentro do Governo - como funciona a máquina pública" e “Perfil, Propostas e Perspectivas do Governo Dilma”.