Quando faltam ética e respeito, não há esperança

A vida dos Analistas-Tributários na Receita Federal nunca foi fácil. Por mais capazes, quase nunca fomos reconhecidos. Por mais ativos, quase nunca fomos valorizados. Por mais que aqui estivéssemos desde o começo, por mais que tenhamos chegado sempre pela porta da frente, sempre fomos preteridos pelos que aqui foram chegando, por todas as portas. A verdade, o mérito, a legalidade, a justiça, isso nunca importou. Lutamos, resistimos, denunciamos, mas a realidade vai piorando cada vez mais, demonstrando que o poço é muito mais fundo que poderíamos imaginar.


Vivemos tempos obtusos onde a busca pelo poder se faz a todo preço e de tal forma que qualquer um se acha no direito de avocar para si uma parte desse poder e de exercê-lo sem observar os limites da lei ou os filtros do comportamento ético. Enquanto os agentes políticos se colocam numa circunstância particular de ataque e sobrevivência, o País vai de rédeas soltas. Instituições importantíssimas para o Estado sucumbem a um corporativismo descarado, desenfreado e inconsequente.


Há 20 anos conhecemos e sofremos com os planos dos fiscais da Receita, que envolvem um suposto resgate de um poder que julgam outrora terem experimentado e a retirada imediata dos Analistas-Tributários da carreira de Auditoria da Receita Federal do Brasil, carreira que querem exclusivamente para si. Sabendo quantos são, as posições que ocupam e o modo como agem, percebemos como foi e tem sido fundamental a resistência do Analistas-Tributários e sua luta diária que impedem, até hoje, a consolidação de tal projeto de poder.


Definitivamente, a experiência da gestão da Receita Federal pelos próprios fiscais não apresenta um saldo positivo. A Casa perdeu prestígio e produtividade, tem estampado mais manchetes em virtude dos escândalos do que pela inovação tecnológica ou presença fiscal, infelizmente. Sem ter o que oferecer à sociedade e, evidentemente, sem respaldo fora de seus próprios muros, a associação formada por sindicalistas que em muitos casos se confundem com os administradores do órgão volta sua artilharia para o regimento e a organização interna da Receita Federal. No ano de 2015 a agenda institucional foi alinhada à agenda do sindicato dos fiscais, com resultados desastrosos para o Brasil, para a Receita Federal e para a Carreira de Auditoria.


A cruzada fiscal pelo poder é a crônica de uma tragédia anunciada. A Casa está inviabilizada por essa ideologia, que vai desrespeitando e distorcendo as normas, quebrando processos, desmotivando o quadro funcional e prejudicando toda a sociedade de um modo criminoso e inaceitável.


Os servidores dessa Casa que não se alinham ao absurdo são diariamente constrangidos, agredidos em sua dignidade pessoal e profissional. Não há mais ânimo, nosso espírito organizacional se apaga. Onde não há ética e respeito, não há esperança.


Lamentamos, mas nos vemos obrigados a levar ao conhecimento dos Analistas-Tributários da Receita Federal do Brasil o pedido recente de exoneração do chefe da Sacat da DRF Varginha/MG, um Analista-Tributário, única alternativa que lhe coube depois de impedido de decidir sobre o que legalmente era de sua competência. O constrangimento ao servidor ilustra bem como a sombra do corporativismo avança sobre tudo e sobre todos que não concordam com os devaneios sindicais dos fiscais. Apesar de sabermos que nossa luta é difícil, desigual e muitas vezes ingrata, nós Analistas-Tributários seguiremos nesse embate pois os interesses republicanos e a legalidade devem prosperar. Nunca deixaremos de defender nossa Carreira e a Receita Federal do Brasil.


O texto que segue é o pedido de exoneração do Analista-Tributário, chefe da SACAT da DRF Varginha/MG, que foi enviado para o delegado por meio do notes e soa como mais um alerta para a que Receita Federal do Brasil cumpra seu papel perante a sociedade.


Senhor Delegado, 


Considerando que o princípio constitucional da eficiência, insculpido no art. 37 da Constituição Federal, é o que impõe à administração pública direta e indireta e a seus agentes a persecução do bem comum, por meio do exercício de suas competências de forma imparcial, neutra, transparente, participativa, eficaz, sem burocracia e sempre em busca da qualidade, rimando pela adoção dos critérios legais e morais necessários para melhor utilização possível dos recursos públicos, de maneira a evitarem-se desperdícios e garantir-se maior rentabilidade social;


Considerando que a Portaria DRF/VAR n° 3, de 2015, assim como todas as portarias de delegação de competência da DRF/VAR que a antecederam, sempre foram utilizadas como instrumento de descentralização administrativa, com o objetivo de assegurar maior rapidez e objetividade às decisões, situando-as na proximidade dos fatos, pessoas ou problemas a atender, nos termos do previsto pela Decreto-Lei n° 200, de 1967, e Lei n° 9.784, de 1999;


Considerando que a Lei n° 10.593, de 2002, com a redação dada pela Lei n° 11.457, de 2007, reserva aos ocupantes dos cargos de Analista-Tributário e de Auditor-Fiscal uma série de atividades concorrentes inerentes às competências da Secretaria da Receita Federal do Brasil, dentre elas, as atividades da Sacat, previstas no art. 243 do Regimento Interno da RFB, aprovado pela Portaria MF n° 203, de 2012, salvo os seus incisos IV e IX, cujo exercício daquelas atividades sempre foi remetido aos Auditores-Fiscais vinculados ao Gabinete dessa DRF, desde a reestruturação desta Sacat em 2013, sem que houvesse dúvidas sobre esse disciplinamento;


Considerando que os Despachos Decisórios são os únicos atos administrativos existentes no âmbito da RFB, com a finalidade de decidir sobre demandas em matéria de competência das autoridades relacionadas para a edição daqueles atos, nos termos do art. 3° da Portaria RFB n° 1098, de 2013, e de seu Anexo I, entre elas, o Delegado da Receita Federal do Brasil, o qual , por sua vez, não está impedido de delegar sua competência a outro titular de chefia, conforme o seu art. 5° e a legislação supramencionada;


Considerando que a Portaria DRF/VAR n° 3, de 2015, possui, no mínimo, presunção de legalidade e não foi retirada do mundo jurídico; e


Lamentando que as disputas internas por espaço entre os cargos da Carreira de Auditoria da Receita Federal do Brasil tenham ultrapassado o limite da razoabilidade e da racionalidade, a ponto de comprometer o bom andamento dos trabalhos da RFB;


Entendo por bem, desde já, e em caráter irrevogável, solicitar meu pedido de dispensa da função de Chefe da Seção de Controle e Acompanhamento Tributário da Delegacia da Receita Federal do Brasil.


Encaminho este pedido com cópia para os demais Chefes de Seção e Agentes da DRF/VAR, bem como aos colegas das Equipes desta Sacat, para agradecer o grande serviço prestado pelo trabalho conjunto que realizamos nestes últimos dois anos.


Infelizmente, deixo a função de Chefe da Seção com a sensação de ausência do dever cumprido, porque gostaríamos de colaborar muito mais e não concluímos o processo de organização dos trabalhos de arrecadação de toda a nossa jurisdição, porém saio ciente de que nos esforçamos ao máximo, no limite de nossa capacidade, para a melhoria dos serviços prestados por nossa Delegacia.


Respeitosamente,


Alexandre Magno Cruz Pereira
Analista-Tributário da Receita Federal do Brasil
Chefe da SACAT - DRF Varginha/MG