Uma LOF para por fim a Receita Federal e desestabilizar o sistema tributário brasileiro

O completo esvaziamento da Receita Federal e a desestabilização do sistema tributário brasileiro. Essas seriam as consequências caso a proposta de Lei Orgânica do Fisco (LOF), produzida pela administração da Receita Federal em conluio com a entidade sindical que representa seus interesses, seja aprovada. 


Ao anunciar que o Ministério da Fazenda encaminhou a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) um texto de LOF, a entidade sindical que representa os interesses dos administradores da RFB comemora como uma das principais “inovações” do projeto a seguinte mudança: “a retirada da expressão “no exercício da competência da RFB”. Isso significa dizer que o Auditor passa a agir com atribuições próprias e não no uso da competência do órgão.” 


Essa proposta é a prova inequívoca do absoluto sequestro da máquina pública visando atender interesses de uma corporação administrativo sindical que não encontra limites para se apropriar das estruturas de Estado em benefício próprio. O texto, anunciado como inovador, apresenta o que há de mais anacrônico em termos de gestão e, principalmente, demonstra, sem deixar nenhuma dúvida, o quanto a existência de uma burocracia estatal elitista, retrograda e conservadora pode não apenas travar avanços da máquina pública como, acima de tudo, colocar em risco a própria estabilidade do serviço público e o atendimento das demandas da população. 


Chama atenção também que no mesmo momento em que gestores nas unidades regionais são estimulados a buscar um maior contato e aproximação com a sociedade, mostrando as realizações do órgão, a administração central caminha em sentido contrário construindo, de forma espúria, um projeto que, em nenhum momento, leva em consideração o interesse público e a busca por uma administração tributária e aduaneira mais eficiente. É ainda mais espantoso que a administração da RFB apresenta uma proposta desta natureza em um momento em que a sociedade clama por mais eficiência nos serviços públicos, assim como cobra o fim de privilégios, há muito inaceitáveis, exigindo rigor e transparência da administração. 


O texto defendido pela alta cúpula da Receita Federal é repleto de exemplos que revelam os verdadeiros interesses que motivam esses administradores e seu sindicato. Não há como negar que todo esse esforço visa construir um mundo de privilégios no serviço público beneficiando inclusive maus servidores, conforme fica evidente nas propostas abaixo: 



  • Os auditores-fiscais terão um regime jurídico especial, diferenciando-os do restante do serviço público;

  • Os auditores-fiscais terão direito à prisão especial em sala especial de Estado Maior;

  • Os auditores-fiscais não poderiam ser presos em flagrante: somente por ordem judicial escrita;

  • Os auditores-fiscais poderão ausentar-se do serviço durante o expediente sem prévia autorização do chefe imediato;

  • Os auditores-fiscais poderão retirar sem prévia anuência da autoridade competente, qualquer documento ou objeto da repartição

  • O projeto também retira prerrogativas do Ministério da Fazenda transferindo-as para a RFB, deixando o órgão ainda mais corporativista;

  • Limita os poderes do Presidente da República que só poderá escolher um auditor-fiscal para o cargo de secretário da RFB;

  • Confundem servidores do Fisco com o cargo de auditor. 


Desde o início do processo de discussão da LOF, a Diretoria Executiva Nacional do Sindireceita tornou público seu posicionamento. Esta entidade sindical e seus filiados não participariam de um processo cujo o único objetivo visava referendar um texto que não traduziria as reais necessidade dos Analistas-Tributários, bem como as aspirações dos contribuintes. 


Nunca nos recusamos a trabalhar em conjunto, mas sempre nos negamos a legitimar um projeto fadado ao fracasso. A Diretoria Executiva Nacional do Sindireceita adotou como estratégia a busca de canais de interlocução fora da Receita Federal por ter a convicção que internamente não havia nenhuma condição de se discutir de forma técnica, profissional e isenta um verdadeiro projeto de LOF. O fato atual reforça a história conhecida por todo e qualquer Analista-Tributário, ou seja, não é com a administração da Receita Federal que vamos conseguir dialogar e obter nossas conquistas e o reconhecimento que o cargo merece. 


Da mesma maneira que sempre nos recusamos a cumprir o papel de coadjuvantes nesta luta, asseguramos a toda a categoria que este projeto, nos termos que foi encaminhado não passará. A LOF exige consenso e o Sindireceita e os Analistas-Tributários nunca compactuaram e jamais defenderão projetos espúrios que visam apenas construir ilhas de segregação e ilusão no serviço público brasileiro. Nosso compromisso é com a defesa dos interesses de cada Analista-Tributário, mas temos também um compromisso com a defesa da melhoria e do aprimoramento do serviço público e, por consequência, com o cidadão. 


Aos fatos relatados acima é preciso acrescentar que mesmo sabendo dos reais interesses que motivaram a cúpula da RFB e seus representantes sindicais a dar andamento a esta LOF, a Diretoria Executiva Nacional do Sindireceita acompanhou todo o processo participando de reuniões que foram amplamente divulgadas em nosso Boletim. Nessas oportunidades apresentamos propostas e argumentos, deixando clara as convicções da categoria. Na última quinta-feira, dia 5, estava prevista uma reunião final entre a cúpula da RFB e a diretoria do Sindireceita, que foi desmarcada na última hora sob a justificativa que não seria mais necessária a apresentação de contraproposta. O texto elaborado pela DEN leva em conta todo o acumulado dos debates, plenárias e discussões realizadas pela categoria. Por óbvio, um texto diametralmente oposto ao defendido pelos administradores e seu sindicato. Veja o Boletim nº 169 de 05 de setembro de 2013  e o Boletim nº 163 de 28 de agosto de 2013


É claro que chama a atenção o fato da RFB ter decidido apressar o passo e encaminhar uma proposta, mesmo sem considerar o texto produzido pelo Sindireceita. Há outro componente muito importante neste contexto. Trata-se do processo eleitoral do sindicato dos administradores da RFB, uma eleição que tem entre os pontos principais de debate o encaminhamento desta proposta de LOF. Assim, fica evidenciada, mais uma vez, a fusão entre os interesses dos administradores da RFB e o sindicato que os representa. É neste universo conturbado que ocorrem as negociações no âmbito da administração da RFB, que na grande maioria das vezes, utiliza os gabinetes do órgão para formular atos administrativos, instruções normativas e toda gama de decisões em favor da categoria que integra.


O cenário sempre foi este. A diferença agora é que não há mais como negar o aparelhamento da administração da RFB por interesses sindicais da corporação a que pertencem os gestores da casa. Ao longo dos anos, especialmente nos dois últimos, a Diretoria Executiva Nacional do Sindireceita trabalhou intensamente pela defesa dos Analistas-Tributários. Construímos um projeto de atribuições que reconhece a importância dos cargos da Carreira Auditoria, da mesma maneira que busca o ganho de eficiência para o órgão e, por consequência, gera benefícios ao contribuinte. Vamos continuar lutando por este projeto, assim como vamos nos mobilizar contra qualquer ação, projeto ou atitude que tenha por objetivo reduzir o papel do Analista-Tributário. Fiquem certos de que não há nenhuma possibilidade do projeto de LOF nos termos apresentados pela RFB prosperar. 


Se já não havia nenhuma chance de um projeto de privilégios como esse ser aprovado no Brasil, agora menos ainda. O Sindireceita adotará todos os caminhos possíveis para impedir o andamento deste projeto de poder. Um sonho de privilégios que não se concretizará.